Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 03 de março de 2016

Orgulho e Preconceito e Zumbis (2016): diversão passageira e esquecível

Adaptação de livro baseado em clássico de Jane Austen não assusta, é um pouco divertido e só.

Jane Austen é uma das mais importantes escritoras da literatura britânica. Vários de seus livros mais importantes já foram transpostos para as telas do cinema desde os primórdios da Sétima Arte. No entanto, com a recém retomada do universo de zumbis e a onda de adaptações de histórias clássicas com temas mais modernos (como triângulos amorosos improváveis e sem graça), logo suas histórias também foram alvo dessas misturas. E a primeira “adaptação” que chega aos cinemas é “Orgulho e Preconceito e Zumbis”, escrito e dirigido por Burr Steers, a partir do livro de Seth Grahame-Smith.

A história se passa numa Inglaterra alternativa, em que a epidemia de zumbis é algo comum naquela sociedade, o que gera a necessidade de várias profissões e hábitos ligados ao combate a essas criaturas. A caça e extermínio de zumbis cria também uma divisão de classes involuntária, uma vez que as famílias precisam aprender técnicas de combate do oriente, com as mais ricas adquirindo técnicas japonesas, como o estilo samurai ou caratê, e as mais pobres técnicas chinesas, como shaolin ou kung-fu. Em meio a tudo isso somos apresentados a família Bennet, cuja matriarca (Sally Phillips) tenta conseguir um casamento proveitoso de uma de suas cinco filhas com o herdeiro da família Bingley (Douglas Booth). Na noite do baile em que Jane Bennet (Bella Heathcote) deveria conquistar seu futuro marido, o coronel Darcy (Sam Riley), rico e notório matador de zumbis, se interessa por Elizabeth Bennet (Lily James), filha mais velha da família.

A partir daí o roteiro se desenvolve com uma adaptação da trama de Austen bastante competente (por incrível que pareça), com discussões sobre o preconceito de classes, questionamento do papel da mulher, tanto na família como na sociedade de modo geral (tema bastante atual, diga-se). Apesar da pouca profundidade do texto, os personagens principais são desenvolvidos o suficiente para que causem um mínimo de empatia com o público, com alguns diálogos bem acima da média para um filme do gênero. No entanto, durante toda a projeção os mortos-vivos fazem pouca, ou nenhuma, diferença no desenvolvimento da trama, o que mostra como foi inadequada a inclusão dos mortos-vivos nessa história. Nem mesmo as execuções dos monstros são minimamente divertidas ou criativas. O único ponto positivo é a inclusão de planos subjetivos, mostrando o ponto de vista dos zumbis.

Além dessa deficiência na abordagem dos zumbis, o longa tem outros problemas técnicos. Provavelmente visando diminuir a censura, a falta de sangue causa estranhamento nas cenas de combate, pois apesar de vermos corpos sendo dilacerados (com ajuda dos efeitos sonoros num volume exagerado) de várias maneiras, as armas permanecem limpas, e os caçadores entram e saem dos combates sem uma mísera gota de sujeira em seus figurinos impecáveis.

Já no campo das atuações, os desempenhos são minimamente competentes. Lily James mostra um pouco mais de desenvoltura do que em seu mais recente sucesso “Cinderela”, porém, longe de algo memorável. Douglas Booth consegue mostrar um pouco a falta de fibra de seu personagem, mas tem pouco espaço para um melhor desenvolvimento. Sam Riley tenta mostrar firmeza e virilidade, mas cai no lugar comum e só consegue expressar o Coronel Darcy como um sujeito frio e antipático, sempre com sua cara de bravo e voz forçadamente rouca. Uma boa surpresa é a participação de Charles Dance (da série “Game Of Thrones”), como o patriarca da família Bennet. Além de emprestar sua persona, ele consegue usar seu talento para acrescentar uma certa doçura àquela família tão aparentemente superficial. Fechando o elenco para garantir as risadas surge Matt Smith, como o primo Parson Collins, sempre atrapalhado na hora e local errado.

Apesar de tantos problemas, “Orgulho e Preconceito e Zumbis” consegue ser minimamente divertido, especialmente para os fãs desses seres. Porém, os poucos fãs de Jane Austen e do material original que tiverem curiosidade em assistí-lo provavelmente ficarão decepcionados.

David Arrais
@davidarrais

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