Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 10 de março de 2016

O Menino e o Mundo (2014): reflexões que muitos filmes adultos não têm coragem

Animação brasileira só estreou por aqui por causa da indicação ao Oscar.

o-menino-e-o-mundo-posterDias antes de saírem os indicados ao Oscar de 2016, muitos brasileiros ficaram tristes com a ausência do país na premiação. Quando saiu a pré-lista de Melhor Filme Estrangeiro e o nosso “Que Horas Ela Volta?” ficou de fora, parecia que este seria mais um ano em que o Brasil apenas veria a festa pela televisão. Foi quando saiu a lista final dos indicados eis a surpresa: a animação brasileira “O Menino e o Mundo” estava indicada ao prêmio de Melhor Animação. As chances eram poucas, é verdade, contra o poderoso “Divertida Mente“, da Disney/Pixar, mas jamais podemos nos esquecer que animações milionárias como “Minions” e “O Bom Dinossauro” ficaram de fora. E só isso já é uma vitória. Tem mais: essa indicação ao Oscar pode dar uma maior visibilidade ao diretor do filme, Alê Abreu, e a uma possível carreira internacional, como aconteceu com Walter Salles e Fernando Meirelles.

Na história, um menino vive no campo e tem uma vida simples, mas seu pai acaba indo para a cidade grande em busca de uma melhor colocação profissional e o garoto faz as malas para ir atrás dele. Lá ele tem alucinações com seu pai e descobre um mundo novo, totalmente diferente de sua vida pacata e descobre também os problemas de uma grande metrópole: desumanização do trabalhador – claramente inspirado em “Tempos Modernos”, de Charlie Chaplin, as desigualdades sociais, repressão policial e a grande população – tudo sob os olhos de uma criança.

Alê ainda foi o roteirista e montador do filme e entrega uma animação incrivelmente bonita, com cenários feitos com giz de cera, lápis de cor, pinturas e colagens. Por exemplo, a cena em que são mostradas favelas foram feitas com recortes de revistas e o resultado é mais realista do que muitos filmes em animações 3D. Tudo isso é retratado com uma trilha sonora melancólica ao passo que funciona também como um protesto, além de uma paleta de cores que anula qualquer diálogo: a cidade é praticamente um personagem da história e é sombria e vibrante ao mesmo tempo.

Essa ausência de diálogos é a maior virtude e o maior problema de “O Menino e o Mundo”. O filme se torna mais vivo e bonito por conta disso, mas ao mesmo tempo se torna enfadonho se contar que ele é quase um média-metragem pela sua curta duração, mas que facilmente se parecem com 120 minutos.

Para um filme de língua estrangeira ser reconhecido mundialmente ele deve falar de valores universais e não somente daquele país. “O Menino e o Mundo” fala sim, de problemas brasileiros, mas por ser um retrato de desigualdade e urbanização, ele pode se encaixar em qualquer metrópole do mundo.

Este é apenas o segundo filme do cineasta Alê Abreu – o primeiro foi o subestimado “Garoto Cósmico” – e o agora com o sucesso do longa, pode abrir as portas para um novo gênero de cinema ao nosso país (animações). Essa nova onda pode ser um alívio para quem não suporta mais as comédias televisivas.

Raphael Brito
@rafalbrito

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