Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Straight Outta Compton – A História do N.W.A.: atitude, violência e arte

A história de um dos mais importantes grupos de Hip Hop é contada de maneira magistral.

straight-outta-compton-posterhip-hop inclui várias formas de expressão artística, como a dança, o grafite, e – como representante mais popular – a música, na forma de rap. Apesar de existir desde o final da década de setenta, esse estilo musical ganhou status e atingiu todas as camadas sociais em meados da década seguinte, em especial com a sua vertente mais agressiva e revolucionária, o gangsta rap. Entre os artistas mais importantes desse momento de origem está o N.W.A., cuja história é contada em “Straight Outta Compton – A História do N.W.A” pelo diretor F. Gary Gray, em filme roteirizado por Jonathan Herman e Andrea Berloff.

Por contar a história de um grupo, o filme é hábil na divisão de tempo de tela e a participação de cada um daqueles jovens: Ice Cube (O’Shea Jackson Jr., filho de Ice Cube), Eazy E (Jason Mitchell), Dr. Dre (Corey Hawkins), DJ Yella (Niel Brown Jr.) e MC Ren (Aldis Hodge). Todos tem espaço para ter suas histórias contadas, desde a luta pela sobrevivência na juventude em bairros violentos de Los Angeles até começarem a colher os louros e desventuras do sucesso meteórico.

É difícil dizer o que há de melhor no longa, dada a imensa qualidade técnica, bem como das atuações, da direção e do roteiro. Talvez um dos maiores acertos seja conseguir causar revolta no espectador ao ver os absurdos que a polícia cometia (e ainda comete, não só por lá, como aqui no Brasil), absurdos tais que criaram o espaço para as origens do movimento e de algumas das músicas mais polêmicas e de maior sucesso do grupo. Afinal, como discordar do teor forte de músicas como “Fuck Tha Police” ou “Straight Outta Compton” quando vemos um grupo de jovens ser abordado violentamente por policiais em uma esquina ao “cometerem o terrível crime de serem negros reunidos na calçada de uma lanchonete”?

Outro aspecto positivo, e aqui todos os méritos vão para a relação diretor-elenco, é a interação dos membros do grupo, especialmente dos protagonistas Corey Hawkins, Jason Mitchell, O’Shea Jackson Jr., com os empresários Suge Knight (R. Marcos Taylor) e Jerry Heller (Paul Giamatti). O’Shea Jackson Jr. faz uso da impressionante semelhança física com seu pai, especialmente no tocante a presença de palco e a ferocidade com que cobrava seus direitos. Infelizmente, deixa um pouco a desejar quando precisa realmente atuar um pouco fora da sua zona de conforto. Corey Hawkins constrói um Dre interessante, que muitas vezes consegue se manter alheio ao que ocorre a sua volta para se dedicar a seu vasto talento musical. Já Jason Mitchell é aquele que possui o arco dramático mais marcante, dado o envolvimento da sua personagem com drogas, crime de vários tipos e sua natureza violenta. Paul Giamatti demonstra seu talento habitual, indo da euforia extrema, ao perceber a mina de ouro que encontrou naqueles adolescentes, ao desespero e pânico com o desenrolar da carreira de seus pupilos. R. Marcos Taylor é uma boa surpresa como o historicamente violento e psicótico Suge Knight. Por conta de sua atuação e a importância histórica de seu personagem para o movimento hip hop, o ator deixa a sensação de que seria interessante vermos a sua história sendo contada por completo no Cinema.

Outro grande reconhecimento que F. Gary Gray merece é a sua condução da história. O ritmo forte e intenso, é mantido durante toda a projeção, com destaque para os conturbados e empolgantes shows do grupo. Os cortes rápidos, reflexo de um minucioso trabalho da equipe de montagem, exaltam a interação público/artistas, conferindo uma dinâmica quase de videoclipe para aquelas cenas. Dada a origem e o ambiente em que aqueles personagens estão envolvidos, a tensão é outro elemento sempre presente em qualquer sequência que sugere a possibilidade de confronto, uma vez que a possibilidade de uma resolução violenta é sempre a mais provável.

A reconstrução de época nos insere naquele momento histórico na luta contra o racismo daquele nos Estados Unidos. Além dos figurinos e carros, que eram moda na época, corroboram com o realismo do filme o uso de imagens reais de arquivo, como o caso de brutalidade policial contra Rodney King, que gerou os destrutivos protestos no sul de Los Angeles.

Em tempos como hoje, em que “twittaços” e “textões no Facebook” são vistos como “atitude”, é reconfortante assistir a história do N.W.A – Niggaz With Attitude (em uma tradução livre, negros com atitude), que remonta a uma época não tão distante em que atitude era realmente enfrentar o sistema de peito aberto, dando a cara, literalmente, pra bater.

David Arrais
@davidarrais

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