Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O Presente (2015): um promissor debute de Joel Edgerton como diretor

Agora se aventurando na função de diretor, Joel Edgerton mostra que tem futuro e deixa ótima impressão com suspense intenso.

O ator ausopresentetraliano Joel Edgerton tem feito aparições em filmes importantes (ou melhor, de grande visibilidade) nos últimos anos: “Êxodo – Deus e Reis”, “Aliança do Crime”, “A Hora Mais Escura”, “O Grande Gatsby”, entre outros. Quase sempre servindo de escada para outros atores brilharem (Christian Bale, Johnny Depp, Jessica Chastain, etc), foi com seu roteiro em “The Rover – A Caçada” que Hollywood descobriu seu potencial também atrás das câmeras, como mentor criativo para projetos (ainda que ele tenha se aventurado em tal função já outras duas vezes, em obras de menor alcance). Neste “O Presente”, Edgerton vai além e atua, roteiriza e dirige um suspense de ótimo nível.

O longa acompanha a história de Simon (Jason Bateman) e Robyn (Rebecca Hall), um casal que se muda para uma área onde o primeiro passou sua infância. Bens de vida e aparentemente apaixonados um pelo outro, tudo muda de figura quando Simon encontra um antigo colega de escola na fila do supermercado, Gordo (Edgerton), que, de maneira até um tanto quanto inconveniente, aproxima-se excessivamente do casal, reacendendo uma relação que promete revelar segredos obscuros do passado de ambos.

Surpreendentemente ou não, o diretor estreante se mostra extremamente competente em conduzir com eficiência a atmosfera gradativa de tensão e suspense que vai tomando conta da trama. O primeiro ato mais parece parte de um filme de drama/romance, sobre um casal querendo superar as dificuldades do passado e seguir em frente, mas a partir da aparição de Gordo, os elementos começam a se transformar e, aproveitando as pistas já plantadas no início pelo consistente roteiro, Joel Edgerton, ao lado do também jovem diretor de fotografia Eduard Grau, consegue realizar esta transição com maestria.

Seja por meio de mudanças no foco da luz, aproveitamento dos espaços em cena, intercalação de planos fechados com planos um pouco mais abertos, jogando a ideia de que o perigo por estar sempre às suas costas, ou pelo velho truque de colocar os personagens em situações que qualquer um de nós não o faria na vida real, a segurança do australiano na função impressiona. Quer dizer, são tipos de abordagens que, com alternância sutil entre elas, somente um cineasta bastante experiente conseguiria realizar com tamanho esmero, o que só torna a façanha do estreante ainda mais digna de reverências.

O que impede, talvez, um resultado ainda mais satisfatório seja justamente as motivações que Joel atribui ao personagem que ele próprio interpreta, Gordo. Claro que estas não serão reveladas aqui, mas basta dizer que, ainda que tangencie um tema bastante atual, elas em nenhum momento conseguem passar a gravidade que os realizadores parecem tentar atribuí-las. Por outro lado, isso acaba não fazendo tanta falta assim no corpo do geral, já que os pontos altos da obra são exatamente as ações dos personagens que vêm antes e depois de descobrirmos tais “segredos”, juntamente com clima tenso tão bem construído ao longo das quase duas horas de projeção.

Sem cair em armadilhas baratas tão comuns no gênero, tanto de roteiro quanto de direção, algo que seria natural e até aceitável para um debutante, Joel Edgerton entrega um trabalho intenso e digno. Protagonizado por um casal de atores que não aparecem na top list da indústria norte-americana, mas não menos competentes por conta disso e donos de uma carreira sólida e respeitável, “O Presente” é daqueles filmes low profile, que provavelmente passará despercebido pelo grande público, o que é uma pena, pois desperdiçarão uma bela oportunidade de conferir um ótimo suspense.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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