Cinema com Rapadura

Críticas   segunda-feira, 27 de julho de 2015

Pixels (2015): um game over para Adam Sandler e cia

A interessante premissa do filme e algumas boas ideias que surgem no decorrer da projeção simplesmente não impedem que essa comédia de ação cheia de potencial se transforme em mais um filme medíocre típicos de Adam Sandler.

imageO conceito de Pixels veio do ótimo curta-metragem homônimo do francês Patrick Jean (2010), no qual videogames clássicos saem da TV e começam a atacar a Terra. O longa também é (acidentalmente ou não) extremamente similar a uma história curta do terceiro episódio da quarta temporada da maravilhosa animação “Futurama”, no qual o personagem principal, um perdedor viciado em videogames antigos acaba tendo que ajudar os militares a impedir uma invasão alienígena inspirada em – adivinhem – games clássicos.

Não existe problema nenhum nisso. Roteiros podem partilhar premissas básicas e desenvolvê-las de maneira única. E, acreditem, “Pixels” é uma prova disso. O longa, dirigido por Chris Columbus (roteirista de “Os Goonies“, diretor dos dos primeiros “Harry Potter”) pega a plot acima descrita e a aplica à fórmula base de um filme típico do Adam Sandler.

O ator e produtor vive aqui Brenner, um instalador de aparelhos eletrônicos que, na infância, foi vice-campeão em um torneio de videogames, gravado pela NASA e enviado para o espaço como parte de um pacote de apresentação que retratou a vida na Terra durante os anos 1980. No entanto, os aliens que encontraram a tal sonda a interpretaram como um desafio de guerra e enviaram games vivos para desafiar a humanidade, com o prêmio desse torneio sendo o nosso planeta azul.

Brenner é então chamado pelo seu melhor amigo de infância, o atrapalhado Cooper (Kevin James), agora presidente dos EUA, para lidar com a situação. Outro antigo amigo da dupla, o nerd sem vida e teórico da conspiração Ludlow (Josh Gad), descobre a situação e se junta à equipe, que ainda conta com uma inventora militar, Coronel Violet (Michelle Monaghan), e com um antigo rival de games de Brenner, o marrento e convencido Eddie (Peter Dinklage).

Durante toda a projeção, vemos o esqueleto básico da maioria dos trabalhos do comediante, de “Billy Madison – Um Herdeiro Bobalhão” a “A Herança de Mr. Deeds”. Parece que os roteiristas Tim Herlihy (colaborador habitual de Sandler) e Timothy Dowling (“Esposa de Mentirinha”) já possuem salvo nos seus processadores de textos toda a estrutura dos filmes do astro, com a trama de amor, o antagonista certinhos ambicioso, o coadjuvante pirado (que, ainda bem, dessa vez não é vivido por Rob Schneider)…

Não adianta dourar a pílula de força do Pac-Man aqui. Por mais que Columbus seja o cineasta ideal para lidar com a nostalgia oitentista e tenha o apuro visual que o DNA da história pede ou que Sandler tenha ao seu redor um elenco estelar, repleto de atores com um excelente timing cômico, como Dinklage, Gad e Monaghan, e que a fita conte também com intérpretes do calibre de Brian Cox e Sean Bean. Tudo isso vai pelo ralo graças ao fator Sandler e o fato de que tudo tem de se adequar a ele e sua fórmula.

O roteiro é um verdadeiro festival de clichês e chavões estereotipados, sem o menor carinho pelos seus personagens, o que impede que nos importemos com as situações e com aquelas figuras em cena. A situação fica tão complicada que, em dado momento, o guião rouba de “Armageddon” uma piada envolvendo impostos.

O pior é ver Sandler repetindo (desanimadamente) várias vezes seu “orgulho nerd”, sempre de maneira falsa e patética, especialmente em uma obra que usa uma imagem tosca e ultrapassada dessa tribo. É óbvio que Sandler não conhece esse público e suas tentativas de jogar com ele soam forçadas, o que também se aplica à sua (inexistente) química com Michelle Monaghan, com a atriz desperdiçada pelo roteiro e reduzida a objeto de desejo do protagonista e migalhas para o público feminino, que é ofendido repetidas vezes no decorrer da projeção.

Josh Gad tem apenas duas cenas onde pode brilhar de maneira doce e atrapalhada, uma envolvendo os militares e a outra em uma festa, enquanto Peter Dinklage se transforma na melhor coisa do filme, justamente por sua atitude de quem não está nem aí. Já Brian Cox e Sean Bean vivem meras caricaturas militares, sendo que o personagem de Cox nem mesmo um encerramento digno possui, mesmo se apresentando como o grande rival do grupo do protagonista.

As setpieces com os aliens ao menos são visualmente interessantes, com destaque para o combate baseado em Pac-Man e a participação de um análogo do criador do amarelado personagem. A ideia dos aliens usarem figuras famosas da década de 1980 como avatares é bastante interessante e razoavelmente bem utilizada pela produção, assim como o conceito atual de troféus em games também é lançado de maneira bacana (com exceção do criminoso e sem sentido final que dão ao Q*bert), mas o contexto impede que nos importemos com a ação, especialmente por conta de uma série de gags mal encaixadas.

O que dói mais em “Pixels” é o fato que o longa tinha tudo para se tornar o filme definitivo de games nostálgicos e ser uma ode aos anos 1980. Acabou desperdiçando tudo isso e se revelando apenas mais uma comédia de ação com o selo Adam Sandler de mediocridade, com o pacote completo de imbecilidade, autoadoração e misoginia. Melhor ficar em casa e rever “Detona Ralph”.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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