Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 19 de outubro de 2014

O Juiz (2014): Robert Downey Jr. estrela eficiente drama familiar

Um tão típico quanto eficiente feel good movie hollywoodiano tem no talento e carisma do ator sua principal força.

Robert DowneyO Juiz Jr. é, de alguns anos para cá, o ator mais valorizado de Hollywood. Após dar a volta por cima em sua vida e carreira como o super-herói canastrão Homem de Ferro, o ator vem galgando espaços (e cachês!) cada vez maiores no mercado cinematográfico, chegando a negociar cifras inimagináveis para aceitar um papel. Excessos à parte, é algo absolutamente merecido, tamanho é o carisma e talento do nosso Tony Stark. Neste “O Juiz”, sua participação basicamente sustenta o filme inteiro, construindo dinâmicas interessantes com os outros personagens, fazendo com que um simples feel good movie hollywoodiano se torne um ótimo entretenimento.

O longa acompanha um recorte da vida de Hank Palmer (Downey Jr.), um advogado importante de uma grande metrópole dos Estados Unidos que se vê obrigado a voltar a sua pacata cidade natal quando a notícia do falecimento de sua mãe chega até ele no meio de um julgamento. Distante da família há muitos anos e com sérias desavenças com o pai (Robert Duvall), um juiz local respeitado e importante que está sendo acusado de assassinato, Hank irá passar por provações que colocarão todo o seu talento como homem da lei à prova, bem como sua capacidade de encarar os fantasmas do passado e de se reconectar com um lado importante da sua vida que, com o tempo, foi sendo deixado de lado.

Do ponto de vista do roteiro, escrito por Nick Schenk, Bill Dubuque e David Dobkin, este também responsável pela direção, a fita não reserva grandes surpresas. Segue mais ou menos aquele padrão das obras de tal (sub)gênero que saem constantemente da indústria norte-americana todos os anos. O diferencial, aqui, é mesmo a qualidade da interação entre os personagens, representados com excelência pelos nomes já citados anteriormente. Assim, é comovente ver um artista consagrado como Robert Duvall, no alto de seus 83 anos de idade, se entregar com tamanha paixão e competência a um papel, conferindo uma força contagiante na construção da sua relação com o personagem de Downey Jr. Com um papel um pouco menor, ainda temos Vera Farmiga transbordando talento como uma mulher do passado de Hank.

Relação essa que encontra uma bonita ressonância na relação do próprio Hank com sua filha pequena, Lauren. Quando esta vai passar o final de semana com o pai, a convivência entre os dois serve como um espelho de tudo o que um dia houve de bom naquele degradado ambiente familiar, assim como o que hoje há de ruim, quando ela pergunta, por exemplo, por que o pai vai se divorciar da sua mãe. Outro momento pontual bastante sintomático ocorre quando Hank vai apresentá-la ao avô pela primeira vez, alertando-a de que ele pode vir a ser rabugento e não muito cortês, o que acaba por se provar um exagero de sua parte, com avô e neta desenvolvendo uma relação de carinho que há muito havia sido perdida quando se trata de pai e filho, fazendo com que o protagonista passe a refletir sobre sua convicções e relativizá-las em certa medida.

Com a fotografia a cargo do experiente Janusz Kaminski, autor de trabalhos memoráveis com Steven Spielberg como os de “O Resgate do Soldado Ryan” e mais recentemente “Lincoln” e “Cavalo de Guerra”, o polonês utiliza bem o contraste e os tons frios e pasteurizados para criar uma atmosfera de distanciamento e melancolia entre os personagens, ilustrando com precisão a tristeza daquele lugar. Além disso, o longa é pontuado também por uma trilha sonora eficiente, apesar de não particularmente marcante, que em nenhum momento soa intrusiva ou exagerada, sendo usada corretamente como uma ferramenta auxiliar e discreta, e não para reforçar ainda mais o “dramalhão” acompanhado em tela.

Existe um motivo para que filmes com tais temáticas sejam, em geral, bem recebidos pelo grande público. São obras que tratam de problemas muito comuns para essas pessoas; o distanciamento de um familiar – ou mesmo a perda de um; relacionamentos mal resolvidos do passado; a tentativa de reconciliação com a família. Somos colocados frente a situações semelhantes com certa frequência, e ver uma história com a qual podemos nos identificar dessa forma, com ótimas atuações e uma parte técnica afiada, ainda que apoiada em um roteiro padrão, é sempre algo confortante e bem-vindo.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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