Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 13 de junho de 2014

Amor, Plástico e Barulho (2013): os altos e baixos da vida

Um eficiente retrato do subúrbio brasileiro por meio de uma história puramente humana.

Amor Poster“Amor, Plástico e Barulho” é um premiado longa pernambucano (inclusive com incursões internacionais) dirigido por Renata Pinheiro, que conta a história de duas mulheres experimentando momentos opostos em suas carreiras, mas que compartilham a paixão pelo Brega e em tudo que ele traz junto, dinheiro, glamour, sucesso e muitas outras coisas, nem todas boas..

Jaqueline é uma experiente cantora do ramo que já emplacou grandes sucessos, mas que agora amarga um período de declínio na carreira. Shelly é uma jovem dançarina que sonha em se tornar cantora como Jaqueline, sua nova companheira de banda e referência nesse universo artístico. Interpretadas respectivamente por Maeve Jinkings (“O Som ao Redor”) e Nash Laila (“Tatuagem”) com uma intensidade que transborda a tela e contagia o espectador, o filme tem na atuação de ambas uma de suas principais forças.

Ambientado no subúrbio do Recife, é interessante como Renata Pinheiro e seu corroteirista Sérgio Oliveira abordam de maneira inteligente esse recorte de uma realidade tão representativa em nosso País. Para tanto, é curioso saber que a ideia do projeto em questão ocorreu à diretora justamente em um bate-papo com uma banda de Brega, também em um subúrbio de uma cidade nordestina, mostrando que desde o início foi a vida maluca daquelas pessoas que despertou em Renata o desejo de representá-las em tela, e não somente um filme sobre uma banda qualquer, genérico. Dessa forma, o seu olhar para com seus personagens é sempre carinhoso, sem julgamentos pré-concebidos, contextualizando seus medos, anseios e aspirações sem soar piegas ou clichê.

Por outro lado, é necessário colocar que, em meio a tantos acertos e virtudes, alguns aspectos negativos não passam despercebidos. O ritmo da fita, por exemplo, é bem irregular, apesar de sua curta duração. A fotografia também é excessivamente escura, em uma tentativa de ilustrar o submundo daquele meio no qual Shelly e Jaqueline estão inseridas. Em determinados momentos, a tentativa é bem sucedida, mas em outros acaba tornando algumas cenas confusas, especialmente aquelas estabelecidas dentro de boates. Porém, não é nada que comprometa significativamente o resultado final da obra, ou mesmo o seu conjunto como um todo.

Superados tais ruídos, a diretora é extremamente feliz ao estabelecer com grande eficiência um belo contraste que permeia toda a película em seus quase 90 minutos de projeção; da felicidade de Shelly com todo o glamour daquele universo recém-descoberto, com a tristeza e a depressão de Jaqueline ao vivenciar um arco descendente em sua carreira, em uma dinâmica poderosa que sustenta o longa em sua totalidade. Não à toa, a câmera é colocada diversas vezes colada no rosto das duas, em um primeiríssimo plano claustrofóbico que nos prende aos sentimentos e sensações de ambas, ainda que diametralmente opostas.

A jornada das duas culmina em um fantástico epílogo entre os créditos finais, que sintetiza de maneira magistral os sonhos destruídos, por ora, da ingênua Shelly. Afinal, em um mundo recheado de preconceitos, de julgamentos realizados a partir de estereótipos, em que o sucesso é descartado (e descartável!) com a mesma velocidade em que se é alcançado, é absolutamente compreensível que uma jovem garota continue em busca de sua felicidade mesmo contra todas as adversidades, ainda que esta só se concretize em sua mente, enquanto ela se enterra no fundo de um ônibus velho, sozinha e desamparada.

Esse filme fez parte da programação da 2ª Mostra Cultura de Cinema Brasileiro, em Fortaleza, em junho de 2014.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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