Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 21 de abril de 2014

Julio Sumiu (2014): uma sequência de absurdos sem graça

Roteiro de pouca inspiração e cheio de falhas acaba com o que poderia ser uma comédia interessante, se bem explorada.

Julio posterJulio sumiu. Sem mais delongas, esta é a primeira informação que temos quando o filme começa. Edna (Lilia Cabral), ao acordar inquieta certa manhã, vai ao quarto dos filhos Silvinho (Fiuk) e Julio e verifica o dito fato acerca deste último. A partir de então, ela, Silvinho e o marido Eustáquio (Dudu Sandroni) irão tentar encontrar a solução para o mistério do repentino desaparecimento do menino, que nunca tinha dado motivos para que suspeitassem que ele um dia fosse capaz de cometer um ato de tamanha irresponsabilidade, o que logo os leva a suspeitar que algo de muito ruim pode ter acontecido.

Dirigido por Roberto Berliner, que até então só tinha trabalhado em documentários, e roteirizado em colaboração por Patrícia Andrade e Vitor Leite a partir do livro de Beto Silva, “Julio Sumiu” é a típica comédia enlatada que tem saído a rodo no circuito nacional nos últimos anos. Na trama, uma família comum, composta de pessoas comuns e colocadas em uma situação absurda para gerar conflito, baseando sua comicidade no exagero que este provoca, em todos os sentidos possíveis, nos indivíduos envolvidos em tal contexto.

Teoricamente, esta é uma proposta que teria boas chances de dar certo. Uma abordagem eficiente acerca de uma tradicional família brasileira desta nova classe média que emergiu na última década, com seus medos, vícios e dramas, poderia render uma ótima comédia. O problema maior reside em um roteiro que, ainda que o tente fazer de forma muito tímida, prefere apostar em personagens estereotipados e unidimensionais, com motivações vazias e sem aparente explicação, além de carregar um enredo básico e inconsistente, de pouquíssima criatividade.

Equilibrando duas linhas narrativas paralelas sem qualquer inspiração, o longa se desenvolve de maneira previsível e recheado de momentos extremamente descartáveis. A personagem de Carolina Dieckmann, Madalena, por exemplo, poderia ter sido cortada sem qualquer tipo de prejuízo para a história. Mas evidente que os realizadores preferem tê-la no elenco apenas para explorar seu sex-appeal, quase como se tivessem consciência da fragilidade da trama e quisessem prender a atenção dos espectadores da maneira mais apelativa possível. Sobre isso, o longo plano que apresenta a, sim, bela e sensual Madalena, é absolutamente sintomático.

Desta feita, se em dado momento da projeção nos deparamos com uma Dona Edna absolutamente transformada, vociferando as gírias de adolescente e/ou de traficantes que tanto foi motivo de repressão dela para com seu filho Silvinho, com um senhor de meia-idade tomado por um impulso corajoso de ex-militar, ou mesmo com um sistema policial corrupto e bizarramente falho, isto nada nos diz de muito significativo, uma vez que o roteiro não trabalha satisfatoriamente para tirar o máximo proveito de tais situações. Os arcos de cada personagem e a maneira forçada como eles se unem no terceiro ato são tão pobres que surge a dúvida se era essa a intenção cômica da película.

Funcionando apenas em instantes isolados, muito mais pela competência dos atores envolvidos do que pela abordagem em si, é justo destacar, entretanto, uma das únicas soluções criativas encontradas pelos realizadores: a resposta do mistério central. Sem revelar spoilers, evidentemente, é interessante notar como eles realmente souberam costurar uma solução aparentemente simples e banal de modo tão funcional e coerente com o que foi inicialmente apresentado, ainda que isto passe desapercebido por boa parte dos espectadores.

Assim, tendo uma estrutura episódica que poderia muito bem ter sido encaixada em um dos programas humorísticos de TV, é adequado afirmar que o resultado final de “Julio Sumiu” é bem fraco. No final, para “coroar” o que foi apresentado, ainda somos obrigados a ouvir a personagem de Lilia Cabral, sob a forma de narrativa (absolutamente incoerente com todo o longa, diga-se de passagem), fazer um discurso deveras constrangedor para encerrar a projeção.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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