Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 10 de março de 2014

Walt nos Bastidores de Mary Poppins (2013): um doce entretenimento

Trazendo uma galeria de lugares, personagens e momentos icônicos, longa que conta os bastidores de um clássico da Disney diverte e emociona sem cair em clichês.

WaltWalt Disney foi um dos maiores nomes da indústria cinematográfica norte-americana de todos os tempos. Criou personagens e filmes icônicos, que habitam o imaginário infantil de toda uma geração, e que se perpetuou ao longo dos anos. Como se não bastasse, lidera o ranking do Oscar, com incríveis 59 indicações e 22 vitórias. Isso tudo entre documentários, curtas e animações. Um de seus maiores sucessos, todavia, quase não foi realizado. Foram necessários mais de 20 anos de negociações para que a adaptação do clássico literário “Mary Poppins” fosse finalmente levado para as telonas e conquistasse milhões de pessoas ao redor do mundo, no ano de 1964.

Dirigido por John Lee Hancock e roteirizado por Sue Smith e Kelly Marcel, “Walt nos Bastidores de Mary Poppins” acompanha a história dos bastidores finais dessa longa negociação, que acabou por produzir um musical vencedor de cinco estatuetas do Oscar em sua 37ª edição. Tal projeto só foi concretizado quando os livros já não vendiam tanto e foi motivo de inúmeras divergências entre os roteiristas, produtores e a autora Pamela Travers, tornando o processo de produção muito desgastante e gerando resultados controversos, apesar do sucesso de público e crítica.

O longa se desenvolve tendo como centro narrativo a conflituosa relação entre Walt Disney e a própria Pamela Travers, interpretados com extrema doçura e competência por Tom Hanks e Emma Thompson, respectivamente. Surpreende, inclusive, que ambos tenham sido tão ignorados nas grandes cerimônias de premiação. Personificando personagens marcantes e com atuações bem acima da média, os dois eram apontados como favoritos a serem indicados a vários prêmios, mas não aconteceu.

Aliás, as atuações são grandes destaques . Além de Hanks e Thompson, alguns outros ótimos nomes abrilhantam a película Colin Farell está muito bem como um personagem de suma importância para a trama, assim como Ruth Wilson, que faz uma mulher melancólica e distante em uma composição minimalista, correta e sem exageros. Ainda temos Paul Giamatti, em um papel secundário, de menor peso dramático, mas não interpretado com menos eficiência.

O protagonismo de fato, entretanto, fica mesmo por conta do personagem de Emma Thompson, cuja jornada acompanhamos desde sua infância, logo nos primeiros segundos de projeção, entendendo pouco a pouco os motivos que fizeram daquela garotinha espontânea e feliz, uma mulher tão fria e amargurada no futuro, o que acaba por criar, logo no começo, um forte e impactante contraste. Além da grande atuação, a estrutura narrativa bem executada permite essa identificação com os espectadores.

Partindo de flashbacks constantes, que pontuam e justificam atitudes e comportamentos do presente ilustrando passagens do passado, temos quase dois filmes em um só; ambos eficientes e complementares. O primeiro segue a infância da protagonista, sua relação com a família, especialmente com o pai, e os acontecimentos que moldam sua personalidade adulta. O segundo utiliza esse molde para, como já citado, discorrer sobre os conflitos entre Disney e Travers na produção de “Mary Poppins” no tempo presente.

A montagem de Mark Livolsi é a principal responsável por tal façanha bem sucedida, ao sempre estabelecer de forma orgânica e natural conexões coesas entre as cenas de cronologias diferentes, dando fluidez e um ritmo dinâmico à película, que em nenhum momento se torna cansativa ou cai em monotonia. Toda passagem é importante e contribui de alguma forma para a construção do arco dramático de cada personagem, o que demonstra a segurança dos realizadores e o controle absoluto que estes possuem sobre a narrativa. Outro aspecto bem interessante é a direção de arte, que reconstitui duas épocas bastante distintas uma da outra. Seja no início do século XX, com os flashbacks, ou na década de 1960, o design de produção é deveras competente na construção de cenários, objetos de cena e figurino.

Assim, temos uma experiência simpática e bastante agradável, com enormes méritos artísticos e que em nenhum instante subestima a inteligência do espectador. Apesar de demorar um pouco a engrenar, o resultado final é bastante satisfatório, provando que não precisamos de muito mais do que bons atores, um roteiro correto e uma abordagem criativa e funcional para fazermos de uma história simples um ótimo entretenimento.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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