Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 04 de dezembro de 2013

Um Time Show de Bola (2013): Campanella escapa do 0x0

Tecnicamente competente, embora falho do ponto de vista de roteiro, o filme se sobressai quando trata do assunto pelo qual seu diretor e corroteirsta é apaixonado: Futebol.

Argumentativamente, Juan José Campanella é, ao lado de Fernando Meirelles, o cineasta sul-americano mais influente desta geração. Quem assistiu ao belíssimo “O Segredo dos Seus Olhos” sabe que, além do cinema, o diretor também é apaixonado por futebol.

Fica fácil, então, saber como este “Um Time Show de Bola”, primeira incursão do cineasta no mundo da animação, tomou forma. Além de dirigir o longa, Campanella o roteirizou, ao lado de Eduardo Sacheri (de “O Segredo dos Seus Olhos”) e Gastón Gorali, com o trio trabalhando em cima de um conto escrito por Roberto Fontanarrosa.

Na trama, o tímido Amadeu, cujo universo se resume às partidas de pebolim, à sua quase-namorada Laura e ao bar onde trabalha, vê sua existência virar do avesso quando um antigo e vaidoso rival retorna à cidade como um rico e poderoso jogador de futebol, disposto à tudo para se vingar da única derrota que já sofreu, em uma partida de pebolim contra o nosso herói. Para ajudar Amadeo, os jogadores de seu amado pebolim ganham vida magicamente.

O grande problema de “Um Time Show de Bola” é o fato de que o texto atira para todos os lados e, algumas vezes, erra os seus alvos de maneira grosseira. Temos seres inanimados ganhando vida, uma crítica incisiva ao culto de personalidade, a jornada de Amadeo para sair da sua vida estagnada… Torna-se um exagero quando cada subplot deste roteiro episódico ganha sua própria subplot (que, não raro, não chega a lugar nenhum).

No entanto, é impossível não dizer que o filme não tem lá seus momentos divertidos, especialmente nas discussões entre os jogadores do pebolim, cada qual com personalidades próprias, adequadamente exageradas. São nessas brigas e conversas que as paixões futebolísticas ficam à flor da pele que o filme ganha, de fato, um coração. E é por conta desses momentos que os pequenos futebolistas artificiais ganham a produção, um feito fácil, considerando quão apáticos protagonista e antagonista o são.

Até mesmo o design dos jogadores de pebolim, que seguem a escola George Lucas ao se apresentarem meio acabados para simbolizar o seu uso, parece feito com mais carinho e dedicação que o dos demais personagens. Aliás, os traços caricaturais dos cenários e figuras estão no ponto, com a fita deixando claro com isso que ela não se passa em nossa realidade (como se os jogadores de ferro ganhando vida não fosse dica o bastante).

Mesmo assim, a estrutura narrativa da produção é deveras problemática, tendo sequências bookend em que colocam que a trama principal está sendo narrada por um personagem a outro, e tal recurso é ignorado inexplicavelmente durante 90% da projeção.

O público ainda é obrigado a suportar as intermináveis sequências do parque e do covil secreto do vilão, onde até uma ameaça de estupro toma lugar, fugindo completamente do tom da produção. Alguém tinha de lembrar à Campanella que isso não era um episódio de “Lei e Ordem – Unidade de Vítimas Especiais”.

Mesmo longe do nível dos demais filmes de seu realizador, “Um Time Show de Bola” consegue entreter muito bem, graças a personagens carismáticos que tornam os escorregões da fita perdoáveis. Tecnicamente bem feita e com diversas referências a grandes longas (algumas bastante inusitadas), a animação consegue segurar adultos e crianças nas cadeiras até o apito final.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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