Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 01 de dezembro de 2013

Vovô Sem Vergonha (2013): um show de horrores escatológico

Johnny Knoxville e sua equipe mostram como não fazer humor.

Em 2006, o ator Sacha Baron Cohen ressuscitou o subgênero mockumentary (uma espécie de documentário falso) com “Borat”. Além de uma excelente comédia, o filme sobre o repórter do Cazaquistão era uma contundente crítica à sociedade americana, com suas falhas e preconceitos. Sete anos depois, a turma do contestável programa Jackass, liderados por Johnny Knoxville, fazem o seu exemplar do gênero, “Vovô Sem Vergonha” (mais uma daquelas traduções maravilhosas das distribuidoras brasileiras), com direção de Jeff Tremaine.

O longa conta a história de Irving Zisman (Knoxville), um senhor de oitenta e seis anos de idade cuja filha foi presa por porte de drogas. Por conta disso, ele tem que atravessar o país para deixar Billy (Jackson Nicoll), seu neto, com o pai. Porém, em cada parada da viagem, o velhinho cria confusões e dá em cima de alguma mulher, de preferência da forma mais grosseira possível. Por quê? Porque aparentemente alguém acha isso engraçado.

Desde o início fica visível a intenção da trama de criar as situações mais embaraçosas possíveis. A comparação com a obra de Cohen é inevitável. Há várias cenas extremamente parecidas, como o protagonista comemorar a morte da esposa, uma situação de nudez e excitação pública, a destruição de alguns espaços comercias.

Os diálogos extremamente expositivos servem para disfarçar a falta de um roteiro minimamente sustentável. Dessa forma, ao invés de sabermos a intenção dos personagens ao parar em uma cidade pelo que é visto em tela, temos que ouvir um voice over constrangedor explicando a situação.

A fotografia não consegue manter uma homogeneidade, com alternância constante entre câmeras digitais, câmeras de segurança e película comum. A equipe de montagem faz o que pode para estabelecer alguma ligação entre tais momentos, além de conectar o amontoado de esquetes. Também é impossível descobrir a distância percorrida ou o tempo que passou nesse intervalo.

Mesmo assim, nem tudo são problemas. Há alguns elementos interessantes. A maquiagem de envelhecimento de Johnny Knoxville é bem executada. O ator está irreconhecível. O pequeno Jackson Nicoll, apesar de não possuir qualquer talento interpretativo, é carismático e uma ótima escolha para o papel de criança fofinha. E a sequência que faz referência a “Pequena Miss Sunshine” é memorável.

Os produtores parecem não entender a diferença entre politicamente incorreto e escatologia gratuita. Ver um avô e seu neto dividindo uma cerveja inocente pode gerar reações engraçadas, mas destruir uma festa de casamento apenas para ver a reação (óbvia) das pessoas ultrapassa qualquer limite de bom senso ou de humor.

O filme ainda adota uma postura misógina, racista e covarde, esquecendo um dos maiores atrativos do programa. Se na TV a graça residia em colocar os protagonistas em situações vexatórias e degradantes, aqui a grande maioria das “vítimas” das pegadinhas de Knoxville são negros ou mulheres, em sua maioria obesas.  E para concluir o show de horrores, ainda há uma reviravolta completamente desnecessária.

Fazia tempo que eu não submetia meus olhos e ouvidos a uma experiência tão desagradável. Porém, se você se diverte com excrementos voadores, genitálias expostas e humilhações gratuitas, “Vovô Sem Vergonha” é uma aposta mais que certeira.

David Arrais
@davidarrais

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