Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 01 de dezembro de 2013

Crô – O Filme (2013): da televisão mediana ao cinema medíocre

Personagem cômico da novela “Fina Estampa” ganha desnecessário filme solo com direito a roteiro de Aguinaldo Silva e direção de Bruno Barreto.

Há uma razão porque a maioria dos personagens extremamente cômicos são coadjuvantes, seja no cinema ou principalmente na televisão. Eles estão ali apenas pra nos fazerem rir enquanto a protagonista vive suas dores, dando um alívio ao drama. Conceder-lhes mais tempo em tela é fazer desgastar seus hilários modos de falar, trejeitos ou qualquer outra característica particular que marque sua presença. É também colocar à prova a criação de seus autores e intérpretes ao vê-los fora de sua zona de conforto. Dito isso, é preciso afirmar que o Crô de Marcelo Serrado jamais deveria ter fugido dos mandos e desmandos de Thereza Cristina em “Fina Estampa”.

Em “Crô – O Filme”, o agora personagem principal mora em sua própria mansão, fruto da herança deixada por sua antiga patroa. Lá ele a imita, dando ordens e mais ordens aos seus empregados, Marilda (Kátia Moraes) e Baltazar Zoiudo (Alexandre Nero), esse seu antigo colega de trabalho. Mas esse luxo exagerado, pomposidade e falta do que fazer o incomodam, e ele decide ir em busca de uma nova “deusa de ébano” para o humilhar assim que possível. Abre, então, uma seleção de candidatas, com direito a entrevistas e divulgação na mídia, esbarrando em uma polêmica situação criminosa.

Escrito por ninguém menos do que Aguinaldo Silva, o autor da novela de onde saiu Crô, o roteiro é o maior dos problemas do filme. E olha que eles não são poucos! Começando como um grande e mais chato episódio de folhetim televisivo, a história conta a busca pelo sucesso por parte do protagonista, mesclando com seus delírios oníricos, que são aproveitados para abordar um pouco da infância dele. Mas o uso de efeitos visuais bizarros, de apenas um mínimo de boa criatividade e, principalmente, de piadas velhas e desgastadas já fazem o longa confirmar as desconfianças de que estamos diante de um caça-níquel dos mais bizarros.

O adjetivo vai tornando-se ainda mais apropriado com o caminhar da trama, quando um drama e um leve suspense são introduzidos, adicionando uma linha narrativa paralela ao núcleo de Crô, mais parecendo parte de um outro filme, e bem diferente. Com direito a abordagem da temática “trabalho escravo” e a participação de atrizes latinas, a história deixa a zona do folhetim perigosamente e arrisca-se por um cinema questionável, seja pelo maniqueísmo extremo, seja pelo dramalhão que instala, fazendo-nos temer, com razão, pelo momento em que se dará o encontro dessas duas linhas narrativas.

E quando ele acontece, percebemos que o pior ainda estava por vir, que as poucas piadas, concentradas basicamente no linguajar de Crô e em toda a sua afetação, cessariam ainda mais. Elas dão lugar a uma ação digna de episódios da “Turma do Didi”, com direito a bastão para bater nas cabeças do inimigos e brigas no chão pela arma que insiste em escapar das mãos dos personagens. Mais triste é perceber que o mise-en-scène foi dirigido por Bruno Barreto, um dos mais renomados de nossos diretores. Ver seu nome durante os créditos finais, enquanto uma historinha animada tenta entreter as crianças e compensar a demasiada seriedade da trama, é de fazer colocar as duas mãos na cabeça.

Marcelo Serrado, pelo menos, faz sua parte e diverte, eventualmente, quando o texto permite, especialmente quando abre espaço para improvisações. Sua interação com o Baltazar de Alexandre Nero proporciona os melhores momentos de todo o filme, apesar de Aguinaldo Silva incluir sequências sem qualquer lógica sobre o relacionamento dos dois. Kátia Moraes passa desapercebida ao lado de Serrado e Nero, mas se destaca quando contracena com a sempre elegante Carolina Ferraz, intérprete de Vanusa, a grande vilã do filme.

Outras participações que merecem citação pelo significado e não pelo merecimento são de Ana Maria Braga, Ivete Sangalo e Gaby Amarantos, que estão ali apenas para adicionar star power ao longa, dar-lhe visibilidade. Porque é apenas isso que “Crô”, seja o personagem, seja o filme, estão em busca, já que divertimento eles pouco proporcionam. Você certamente riu mais ao assistir a um episódio da novela.

E que a moda de transportar personagens da televisão para o cinema não se confirme!

Darlano Didimo
@rapadura

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