Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Depois de Maio (2012): para além dos revolucionários

Cheio de boas intenções, filme dirigido por Olivier Assayas peca pelo distanciamento que mantém de seus personagens.

Depois de MaioFilmar a revolução enquanto ela acontece pode não ser a melhor maneira de refleti-la em toda a sua essência. O antes e, especialmente, o depois podem revelá-la ainda melhor, mostrando a sua formação, cheia de utopias (ou não) e a maneira como tudo reverberou ou ainda reverbera na sociedade. É também cinema de mais inteligência e originalidade, menos preocupado com fatos e mais com ideias. Assim Olivier Assayas constrói “Depois de Maio”, um longa focado no pós-68, quando os ecos da revolução ainda podiam ser ouvidos, quando os jovens ainda procuravam contribuir para a formação de um “novo mundo”.

Passada boa parte na França, mais especificamente nos arredores de Paris, centro de toda a revolução de maio de 1968, a trama traz o ponto de vista de alguns jovens estudantes. O principal deles é Gilles (Clément Métayer), um rapaz que divide-se entre os compromissos escolares, a distribuição de jornais independentes e a participação em manifestações. Cheio de idealismo, ele não hesita em enfrentar a polícia em plenas ruas parisienses. Um acidente com um vigilante, provocado por um dos manifestantes de seu grupo, porém, leva-o a dar um tempo, fugir. Dessa forma, vai para a Itália, dando seguimento a uma vida ainda em formação.

Discutir política, cultura e os cernes que sustentavam o movimento do qual seu personagem principal faz parte, no entanto, não é o objetivo dessa obra de Olivier Assayas, responsável pelo premiado “Carlos”. Não estamos diante de um filme que levanta bandeiras ou algo do tipo. Seus holofotes estão sobre as trajetórias das moças e rapazes que o formam, de franceses a americanos. Então, da aula de História ao encontro meio secreto com o atual envolvimento amoroso, passando pelo “esconderijo” em que todo o material gráfico a ser distribuído pelos manifestantes é produzido, acompanhamo-los em boa parte de sua preocupações, sejam elas sexuais, artísticas, profissionais ou, obviamente, sociais.

A falta de obviedade nas intenções do roteiro de Assayas tornam o filme ainda mais corajoso, dando tempo ao tempo, deixando a história revelar-se sem precipitações. O problema está na mise-en-scène do diretor, especialmente no distanciamento que mantém de seus personagens. Com a aparente finalidade de universalizar a condição de Gilles e companhia, Assayas parece ter medo de aproximar-se, de dar mais profundidade a todos. Logo, então, nos vemos em um trabalho de conteúdo evidente, mas que não permite sentir qualquer identificação ou carisma pelos personagens.

Com diálogos curtos e uma tremenda falta de expressividade por parte de seu elenco, cercado de estreantes (com exceção de Lola Créton, a adorável Christine, e India Menuez, a hippie Leslie, não por acaso as melhores em cena), o longa vai levando-se por um ritmo cada vez mais lento, enfadonho. Cheio de cortes bruscos, que interrompem por diversas vezes conversas quase reveladoras, o filme revela uma total falta de sintonia entre Assayas e o montador da obra, Luc Barnier. Salvam-se momentos em que a trilha sonora decide intrometer-se e inserir leveza a truncagem da edição.

“Depois de Maio”, porém, conta com uma excelente fotografia por parte de Eric Gautier, que exibe uma Europa ensolarada, de encher os olhos. As locações naturais colaboram, mas a sutileza de seu trabalho deixa tudo ainda mais belo e límpido, refletindo a aparente essência de seus personagens, abertos a novas ideias e destinos. A definição ajuda no doloroso encerramento do filme, que mantém as idealizações de lado e acrescenta o pouco de emoção que faz falta durante toda a projeção. O desfecho em alta, porém, não compensa no resultado final de um projeto importante que poderia servir como referência caso não se mantivesse tão distante de seus (pós)revolucionários.

Darlano Didimo
@rapadura

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