Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 23 de junho de 2013

Minha Mãe é uma Peça (2013): a impagável D. Hermínia vai aos cinemas

Paulo Gustavo e sua personagem hilária são responsáveis por uma adaptação engraçada, mas que falha em ser cinema de qualidade.

Minha Mãe é uma PeçaAdaptar comédias nacionais do palco para a tela grande não é fácil. Pelo menos, os recentes resultados têm sido decepcionantes. E eles não são poucos. De “Irma Vap” a “Fica Comigo Esta Noite”, de “Trair e Coçar é só Começar” a “E aí…Comeu?”, todos sofrem em sua adequação à linguagem cinematográfica. Alguns até conseguem preservar a comicidade do texto original, mas falham em sua construção de personagens e história e na pouca inspiração da direção, reféns de piadas e tiradas cômicas obrigatórias. Esse é o caso deste ainda assim hilário “Minha Mãe é uma Peça”.

A trama é contada do ponto de vista de Dona Hermínia (Paulo Gustavo), uma mãe super protetora que não possui qualquer papas na língua. Vivendo em Niterói, ela cria dois dos seus três filhos, frutos da relação com o agora ex-marido Carlos Alberto (Herson Capri), em um pequeno apartamento que fica ainda menor por sua onipresença. Mas ela está de partida. Brava por ouvir, por acaso, reclamações doídas de Juliano (Rodrigo Pandolfo) e Marcelina (Mariana Xavier) sobre suas chatices, ela vai passar um período hospedada na casa da tia Zélia (Suely Franco). Quer testar a capacidade dos filhos em se “virarem” sozinhos. E não tarda até que a dupla sinta sua falta.

Mas pouco importa a história padrão de começo, meio e fim escrita pelo roteiro do próprio Paulo Gustavo. O que ganha atenção aqui são os causos contados por Dona Hermínia, bem como seus desabafos sobre os mais variados assuntos. Optando por fazer de seu filme uma espécie de série de esquetes cômicas que podem  ou não fazer sentido juntas, Gustavo consegue preservar a essência do monólogo a que dá vida desde 2005. Para tanto, são necessários inúmeros flashbacks que resgatam momentos importantes e engraçados na vida de sua família.

O objetivo do roteiro é claro: fazer sua protagonista falar, expandir-se para o público. Paulo Gustavo sabe da genialidade de sua criação, bem como da universalidade de sua mensagem, seja no palco ou no cinema, e dá a ela tempo e espaço. Hermínia “interage” com todos à sua maneira, do ex-marido aos filhos, da tia Zélia ao repórter televisivo a quem concede entrevista, pouco deixando-os emitir palavras, sempre fazendo seu padrão moral valer. E o pior é que é fácil simpatizar com ela ou minimamente identificar-se com seus argumentos, exatamente por tratar-se de uma inspiração da vida real.

Mas se os exageros da personagem principal, com seu tom de voz sempre estridente, são compensados pelo bom humor e originalidade, o mesmo não se pode dizer do restante da família. Em sua maioria caricaturais propositalmente, eles também parecem advindos do teatro ou de programas cômicos de televisão, especialmente a Soraya de Ingrid Guimarães, atual esposa de Carlos Alberto, que não hesita em balançar o cabelo, exibindo toda a beleza que acha possuir.

O mesmo expediente aplica-se a Marcelina. Como a adolescente, digamos, fora do padrão de beleza, ela transforma-se em uma espécie de máquina de comer. Todos os assuntos, sem exceção, que a circundam abordam seu excesso de peso e sua insaciável fome. Torna-se irritante a insistência do roteiro em fazer piadas sobre o assunto. Já com o outro filho, Juliano, a trama demonstra um agradável respeito ao tratar sua homossexualidade. É discreta sem perder a comicidade, demonstrando a natural aceitação da irmã mesclada com as técnicas da mãe em fugir do assunto ou abordá-lo indiretamente.

Dirigido por André Pellenz, em sua estreia em longas-metragens, “Minha Mãe é uma Peça” ainda arrisca-se no drama, mesmo que discretamente. Parece querer tornar-se marcante, conquistar o público pelo coração, ir além de um bom passatempo. Mas, de fato, não consegue. A inserção da emotividade por Pellenz é tão fora de hora e frágil que soam muito mais como momentos de homenagem e respeito de uma história de inspiração em vidas reais, cheia de momentos trágicos por mais engraçada que ela possa ser encarada.

Contando com participações especiais de nomes femininos importantes do cenário cômico nacional, como de Mônica Martelli e Samantha Schmutz (ótima como a faxineira Valdéa), o filme traz um elenco que jamais faz jus à retórica da Dona Hermínia de Paulo Gustavo. Sua composição de personagem é simplesmente especial. Tanto que transforma uma série de esquetes em um filme engraçadíssimo, que certamente satisfará os menos exigentes e sedentos por desopilar de uma semana cansativa.

P.S.: Antes dos créditos finais, uma filmagem caseira trazendo a dita musa inspiradora de Dona Hermínia, Déa Lúcia, mãe de Paulo Gustavo, é exibida. É divertido perceber a semelhança entre as duas.

Darlano Didimo
@rapadura

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