Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 09 de junho de 2013

Réquiem para Laura Martin (2011): bizarro em temática, ruim em execução

Problemas em fotografia, montagem e som, além de roteiro forçado e caricato soam como instrumentos desafinados que não se encaixam, resultando em um Réquiem mal-acabado .

Laura MartinO bizarro sempre nos chamou a atenção. Dos distorcidos serial killers às criaturas dos filmes de suspense e terror;  de palhaços criminosos na Gotham City dos quadrinhos às obras de Pedro Almodóvar, que exploram as estranhas facetas do ser humano. E com influência de tal diretor, “Réquiem para Laura Martin” pode ser denominado bizarro em temática, mas, diferente dos trabalhos do espanhol, a denominação também aplica na problemática execução.

Durante a narrativa acompanhamos a decadência causada pela obsessão de um renomado maestro por sua jovem musa inspiradora, que dá nome ao longa.  Os dois se envolvem em uma intensa relação em consenso com o casamento dele e Raquel. A esposa se submete ao triangulo amoroso e às vontades de marido, chegando a conviver com a “outra” na mesma residência. Entretanto, a delicada sinergia do trio é quebrada quando a amante desenvolve uma doença degenerativa e é acolhida pelo casal.

Com estrutura confusa e algumas pontas soltas, o roteiro nos introduz a um protagonista de difícil identificação. Vivido por Anselmo Vasconcellos, o regente falido é apenas um resquício do que outrora fora, diminuindo friamente todos aqueles a seu redor, como se os dominasse. Perdido entre fantasias com a amada, chega ao ponto de propor a um amigo, interpretado por Luciano Szafir (“Eu não tenho talento”, diz a personagem – uma ironia alusiva à própria carreira do ator), que tenha um caso com sua própria mulher.

E não só Szafir, mas também Anselmo Vasconcellos e Cláudia Alencar, que encarna uma frustrada e reprimida Raquel, soam rasos e forçados em toda a projeção. Uma fraca direção aliada a diálogos que parecem uma versão caricata de um texto de Nelson Rodrigues tornam constrangedoras algumas cenas, como o monólogo em que a personagem de Cláudia despeja frustrações em uma Laura inconsciente ou as discussões conjugais que culminam em tapas dignos de comédias pastelão.

A fotografia se apresenta saturada e chega a incomodar o espectador em tomadas externas durante o dia, representando com exagero o caráter onírico da relação entre adorador e musa. Utilizado com essa saturação, um figurino óbvio e maniqueísta, com o predomínio do branco em momentos de satisfação e do preto e ocasiões depressivas, contribui ainda mais para a estética de brilho excessivo. Além disso, a inadequação de certos trajes típicos da região sul ao personagem principal chega a causar risos, quebrando a atmosfera de suspense em determinado ponto da narrativa .

Bastante irregular, a montagem realiza cortes bruscos e, apoiada por uma direção que carece de sentidos, não hesita em mudar o posicionamento de câmera de maneira artificial e que compromete a fluidez dos diálogos.  E mesmo o som encontra seus problemas, com falhas perceptíveis tanto na captação quanto na mixagem, que não encaixa bem o volume dos sons diegéticos. Durante um diálogo, o incômodo crepitar de uma fogueira tem volume instável, dando ideia de um impossível movimento da pilha de troncos em chamas. Apesar disso, a trilha sonora tem seu brilho e produz associações interessantes entre o solitário maestro e uma melancólica faixa com piano, em oposição ao tempo de completude revivido com sua paixão enquanto toda a orquestra toca unida.

Assim, recheado de problemas, “Réquiem para Laura Martin” tropeça em pontos fundamentais que tornam todo o curso do longa confuso. Distante do espectador, após um final pouco impactante, o protagonista termina o filme tocando notas dissonantes. Aliás, dissonância é uma característica que define muito bem a produção, cujos principais aspectos não parecem se organizar no mesmo tom.

Mateus Almeida
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