Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 19 de abril de 2013

Uma Garrafa no Mar de Gaza (2011): um olhar raso sobre um conflito profundo

Abordando os conflitos na faixa de Gaza de maneira superficial, o longa tenta aproximação com o público jovem, mas esbarra na falta de contextualização.

Gaza1Com o advento da internet, podemos acompanhar em tempo real as notícias mundiais, dentre elas os altos e baixos da oposição entre Israel e Palestina e seu estado quase constante de alerta. No meio da transmissão rápida de informação, é por meio de um arcaico e aleatório canal que se inicia “Uma Garrafa no Mar de Gaza”, produção francesa na qual se desenvolve uma perspectiva imparcial da luta entre as duas nações.

A narrativa tem início após um atentado realizado por um homem-bomba em Jerusalém, quando Tal (Agathe Bonitzer), uma estudante francesa que mora em Israel, pede a seu irmão que jogue uma garrafa contendo uma mensagem ao mar. A mensagem, que questiona as razões do conflito que envolve os dois países e a insegurança causada por este estado de permanente guerra, é respondida por Naim (Mahmud Shalaby), entregador de uma loja de camisetas que vive uma vida difícil e receosa à sombra de um futuro incerto perante aos ataques israelenses.

Ao começarem a se corresponder, Naim, bastante irônico em postura defensiva, desconfia da ingenuidade da mensageira da garrafa e devolve, em comentários ácidos, as investidas da estudante por um maior entendimento entre eles. Contudo, este muro é pouco a pouco quebrado e ambos relatam um ao outro suas experiências vividas dos dois lados da guerra, trocando experiências e se aproximando.

Apesar de os protagonistas buscarem maior compreensão sobre a tensão entre os seus países, o filme romantiza e descontextualiza completamente a guerra ocorrente. Em momento algum somos apresentados aos aspectos políticos ou históricos relativos ao conflito e sua origem, vivendo-o por ambos os lados e sem tomar partido, porém nunca entendendo as razões das partes envolvidas de maneira mais aprofundada, o que dá a produção um caráter raso e inocente. De maneira tão descontextualizada quanto a situação das nações, a narrativa apresenta a França e a cultura francesa de maneira heroica, colocando-a como o objetivo ideal, esquecendo-se, todavia, do crescente preconceito que assola o país.

A relação de amizade dos protagonistas torna-se o fio condutor da narrativa e, como um “Romeu e Julieta” moderno, apresenta os dois em lugares e situações opostas: Tal estuda e leva uma vida confortável em Israel, indo a diversas festas com os amigos, enquanto Naim vive com sua mãe em um lar pobre e trabalha com poucas expectativas, desesperançoso com as condições em que vive. O figurino se esforça para desvendar melhor o elo entre estes personagens, mas acaba caindo em representações óbvias que enfatizam as cores das bandeiras de ambos os países: Tal, que teve a iniciativa de contato e compreensão, utiliza com frequência roupas verdes que combinam com seus cabelos ruivos, formando um padrão que representa uma ligação com a bandeira da Palestina; enquanto Naim inicialmente utiliza também um figurino com base no vermelho e verde, mas ao estabelecer ligação com a jovem franco-israelense passa a vestir tons azuis e claros, representando a bandeira de Israel e sua ligação.

O roteiro se desenvolve com base nos e-mails trocados pelos jovens, sem maiores surpresas, mas consegue criar alguns momentos de tensão (em pontos previsíveis da trama) como a presença do exército Palestino cercando Naim e principalmente ao retratar o momento de um atentado Israelense pela ótica da família Palestina. Sendo muito superficial em sua abordagem, repleto de frases feitas e diálogos por vezes forçados, principalmente entre a estudante e sua família, este ainda não desenvolve de maneira profunda os personagens, excluindo-se os protagonistas e a mãe de Naim, interpretada por Hiam Abbass.

Ao tentar estabelecer um contato entre a situação política que envolve Israel e a Palestina com o público jovem, a produção peca principalmente por inocentar o conflito e isolá-lo de um contexto maior. Tendo uma atmosfera leve em sua maior parte, devido a um roteiro superficial e uma direção de arte simplificadora, a produção francesa tem, entretanto, bons momentos em que sua inocência prejudicial nos faz enxergar um futuro mais esperançoso para as tensões da região.

Mateus Almeida
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