Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 16 de outubro de 2012

A Entidade (2012): terror psicológico perde a chance de renovar o gênero

Roteiro se atrapalha e o resultado é apenas razoável.

Casas mal assombradas, entidades misteriosas e seres humanos amedrontados por eventos sobrenaturais. Já vimos inúmeros filmes com essa premissa, sempre se apropriando do mais do mesmo e quase nunca trazendo diferenciais. Desde a divulgação de “A Entidade”, esperava-se um toque especial na trama. Afinal, ela é dirigida por Scott Derrickson, cineasta por trás de “O Exorcismo de Emily Rose”, que impressionou os espectadores em 2005 e venceu o prêmio de melhor filme da Academy of Science Fiction, Fantasy & Horror Films. O que preocupava, entretanto, era o envolvimento dos produtores de “Sobrenatural”, terror meia boca lançado em 2010.

A trama parte do clichê da família que se muda para uma nova casa. O patriarca Ellison Oswalt (Ethan Hawke) é um escritor que tenta recuperar o prestígio de sua carreira. Em busca de uma grande história, ele leva a esposa Tracy (Juliet Rylance) e os dois filhos (Michael Hall D’Addario e Clare Foley) para viver no local onde  uma família foi enforcada e uma criança desapareceu. Ellison começa a investigar o caso de acordo com a perspectiva daqueles que moraram antes dele na residência. Além disso, ele conta com a ajuda de um estranho material de vídeo abandonado no sótão. Obviamente, logo a família Oswalt será alvo de acontecimentos bizarros.

Escrito e dirigido por Scott Derrickson, a ambientação do longa e a apresentação dos personagens é interessante, já que as motivações de Ellison são gradualmente reveladas. Temos a garotinha que não quer morar naquela casa, antecipando a sensação de que algo pode estar errado; o filho que sofre com as constantes mudanças, e a esposa que apoia, mesmo a contragosto, os objetivos do marido. Além deles, a casa é um personagem importante e, aos poucos, começamos a compreender a sua dinâmica por meio do found footage que Ellison encontra com imagens de pessoas em momentos de lazer e, posteriormente, sendo assassinadas.

Acompanhar os questionamentos de Ellison é inicialmente intrigante e Derrickson desenvolve ótimas cenas em que possíveis diálogos expositivos demais explicariam aquela atmosfera, levando para o lado visual tais explicações. Entretanto, se o primeiro ato do filme é mostrado com êxito, o desenrolar da trama sofre com a escassez de boas ideias. O roteiro antecipa bastante para o público as justificativas para os eventos sobrenaturais, fazendo com que Ellison muitas vezes seja imbecilizado pelo roteiro enquanto faz a sua investigação.

Atualmente, seja no terror ou em qualquer outro gênero, o que os cineastas devem buscar é uma nova forma de contar o que já foi contado antes. O que começa como terror psicológico, explorando a fotografia inspirada e a trilha sonora assustadora, termina como um simples terror que não sabe para onde vai. Na direção, Derrickson explora as sombras e a baixa iluminação dos cenários e cria algumas sequências inspiradas (citar aqui a melhor delas pode estragar a surpresa). Mas se por um lado o diretor tenta manter a atmosfera do transtorno psicológico passado pelo protagonista, a maquiagem de mau gosto impede que o público sinta medo, sendo mais um caso daqueles em que o riso é quase inevitável. Destaque para a montagem precisa e pontuada pelo funcionamento do projetor do Super 8, sempre afetado.

A atuação de Ethan Hawke, que sustenta praticamente o longa inteiro, também se perde à medida que ele fica perturbado com os eventos sobrenaturais, ficando um tom acima do esperado principalmene quando relata suas impressões a um policial. O restante do elenco tem pouco ou nada a fazer, a não ser entrar em perigo e despertar no protagonista o instinto de que eles precisam sair dali, mesmo tardiamente. Ainda precisamos lidar com uma parceria sem graça de Ellison com um detetive e a entrada de um estudioso de fenômenos sobrenaturais que, se você pensar bem, não ajuda em quase nada para intensificar o misticismo do roteiro.

Dessa forma, “A Entidade” desperdiça por pouca coisa a chance de se estabelecer como mais um bom terror nas telonas. Quando achamos que os clichês podem se transformar em uma história realmente apavorante, logo perdemos interesse em acompanhar o desfecho do filme. Assim, “A Entidade” se estabelece apenas como um terror razoável que deixa a sensação de que poderia ser bem melhor.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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