Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 07 de outubro de 2012

Hotel Transilvânia (2012): monstros clássicos ressurgem sem boas ideias

Desperdiçando boas ideias e um diretor visualmente inventivo, Adam Sandler aposta no mais do mesmo, uma péssima notícia para aqueles fãs dos monstros clássicos que não gostam do seu estilo de humor. Bom, ao menos os vampiros estão melhor representados aqui que em "Crepúsculo".

Genndy Tartakovsky é um gênio das animações. Criador de “As Meninas Super-Poderosas”, “O Laboratório de Dexter” e “Samurai Jack”, além de ter desenvolvido “Star Wars – Clone Wars” (possivelmente a melhor coisa da hexalogia espacial desde os anos 1990), esse animador nascido na Rússia tem um estilo baseado em traços simples, personagens extremamente expressivos e ações e transições rápidas. As obras prezam por dar igual importância ao visual e à história que está sendo contada.

Portanto, esperava-se que seu primeiro trabalho para o cinema mantivesse o nível de seus trabalhos televisivos. Mas este “Hotel Transilvânia” é um longa produzido (e, de certo modo, estrelado) por ninguém menos que Adam Sandler, que parece ter assumido como sua missão na vida desperdiçar o talento de profissionais competentes nas porcarias que lança – oi, Al Pacino!

A trama mostra o Conde Drácula (voz e aparência de Sandler) como um pai superprotetor que cria um hotel para monstros na Transilvânia, com o local basicamente servindo como um porto seguro para seus pares monstruosos longe da fúria dos terríveis humanos. Para seu desespero, Jonny, um jovem humano desavisado e sem noção, acaba indo parar no seu hotel, justamente no aniversário de 118 anos de sua filha “adolescente”, Mavis, que está louca para desbravar o mundo.

O design dos personagens e do próprio hotel são ótimos, em um maravilhoso trabalho de direção de arte por parte de Tartakovsky e de sua equipe, utilizando-se de conceitos arquetípicos e dando a eles um toque pessoal, respeitando a visão que o público tem desses monstros clássicos e dos ambientes por onde eles transitam.

Todo o estilo do diretor descrito acima foi mantido mesmo em versão computadorizada, com a simplicidade do traço dos monstros funcionando em harmonia com a ágil movimentação da animação. O 3D  gera sequências que são um verdadeiro colírio para os olhos, como a apresentação do hotel e a “disputa” entre Drácula e Jonny nas mesas voadoras.

O problema é que todas essas boas ideias visuais do filme perdem força graças ao fraco roteiro nas quais estão inseridas. Com exceção de Drácula, os demais monstros quase não têm o que fazer e, mesmo quando vemos o Conde ao lado de Frankenstein, Múmia, Lobisomem e do Homem-Invisível, a interação entre o quinteto é praticamente a mesma que vemos entre Sandler e seus amigos em longas como “Gente Grande” (por sorte, nada de Rob Schneider aqui).

Boa parte da projeção é desperdiçada no chatíssimo romance entre Mavis e Jonny, dois personagens que simplesmente não dizem a que vieram. O relacionamento proibido entre os jovens pombinhos é um desenvolvimento lógico do passado dramático do Drácula (cujo flashback  é surpreendentemente efetivo), mas acaba não funcionado e desperdiça o interessante (embora já não original) plot dos monstros verem os humanos como as verdadeiras monstruosidades.

A dublagem nacional teve a ideia de colocar diversos sotaques para os personagens. O Drácula dublado por Alexandre Moreno apresenta um discurso formal com seus empregados, mas se derrete junto à filha e relaxa quando na companhia dos amigos. O estressado Lobisomem ganha um sotaque paulista, os construtores do hotel falam como nordestinos caricatos e por aí vai. É uma ideia bacana, mas não vemos nada na história que peça por isso, com os sotaques servindo mais como distração que como recurso narrativo.

Já as músicas ultrapassam a barreira do brega (“você é o meu tchan”), mas considerando que as versões originais foram escritas pelo próprio Sandler (cuja maior contribuição musical foram as esquetes “Opera Man” no “Saturday Night Live”), então provavelmente as versões nacionais devem estar empatadas em matéria de qualidade com as originais.

De todo modo, se você gosta do estilo de humor de Sandler, provavelmente vai se divertir com o filme. Se não, assista apenas aos créditos finais da produção, que conta com artes de Tartakovsky para o longa, resumindo exatamente a melhor coisa da fita sem ter que aguentar sua história.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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