Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 22 de julho de 2012

Armadilha (2012): roteirista falha em tentativa de suspense claustrofóbico

Responsável pelo ótimo “Enterrado Vivo”, Chris Sparling tenta repetir a ideia, mas a fragilidade de seu trabalho é tanta que faz questionar se não foi golpe de sorte a realização da obra de 2010.

Uma história inteiramente passada debaixo na terra, acompanhando os agoniantes momentos de um homem dentro de um caixão. Esse é o plot de “Enterrado Vivo”, obra independente de 2010 que chamou a atenção pela sua ousadia narrativa e a originalidade e simplicidade de sua trama. Pelo trabalho, o roteirista Chris Sparling recebeu os devidos e merecidos elogios. Talvez por isso tenha tentado repetir a ideia, “adaptando-a” para a superfície e tendo como ambiente claustrofóbico um caixa eletrônico. No entanto, a má concepção do script, cheio de furos e absurdos em seus quase 80 minutos de duração, faz de “Armadilha” um suspense de segunda categoria.

Quem protagoniza o filme é Brian Geraghty, que interpreta o inseguro David. Apaixonado pela colega de trabalho Emily (Alice Eve), mas sem coragem para se declarar, ele é incentivado pelo amigo Corey (Josh Peck) em uma noite de festividade, que será a última da garota no emprego. A conversa entre o casal acontece e continua ao longo da noite, perdurando até o momento em que, a caminho da casa da moça, David para em um isolado caixa eletrônico a pedido do insistente e metido amigo. A partir de então, o trio passa a sofrer a silenciosa ameaça de um desconhecido, de rosto coberto, que parece querer amedrontá-los, ao mesmo em que não medirá esforços para matá-los caso queiram escapar do pequeno espaço em que estão “presos”.

Iniciado de forma cuidadosa, a exceção da falta de necessidade de flashs trágicos ainda nos créditos de apresentação (como se prenunciando o que está para acontecer ao longo da noite), o longa nos introduz a um personagem principal carismático, comum ao extremo, cuja timidez parece ser uma de suas principais características. A notória química com Emily também contribui para o bom começo da obra, principalmente devido à simplicidade da garota, que não coloca dificuldades para as investidas de David. No entanto, o mesmo não pode ser dito de Corey, que desde então já surge como alguém trágico, também disposto a atrapalhar o clima entre o casal, enquadrando-se em um padrão de personagem para o gênero cujo desfecho não é difícil de adivinhar.

Mas se os rumos da história não vão mal em sua primeira dezena de minutos, ao adentrar o caixa eletrônico a situação se inverte e vai até quase o fundo do poço em termos de qualidade. Chris Sparling cria um suspense tão cheio de fatores sem sentido que torna-se impossível embarcar e acreditar nesta trama diferente. Perguntas e perguntas vão se acumulando à medida que a projeção passa. Algumas delas, logo no segundo ato, transformam-se em indignação pelo nível de estupidez que acomete o trio de jovens, principalmente pela negação e medo de fugirem das circunstâncias em que foram colocados.

O roteirista ainda utiliza-se de fatores desonestos para manter o nível de tensão em alta, como na cena em que um desconhecido de trajes desconfiáveis entra no caixa eletrônico, assustando os rapazes e a moça. Mas o pior é que esta e outras sequências não acontecem por acaso. Elas trabalham em prol de um desfecho que não poderia ser mais absurdo, que só será “engolido” pelos mais inocentes dos espectadores. Em suma, Sparling menospreza a inteligência da audiência, não explica muitos dos questionamentos deixados em aberto e ainda tem audácia de deixar um plot para uma improvável continuação.

O que ainda compensa em “Armadilha” é a direção de David Brooks que, apesar de não se igualar ao trabalho realizado por Rodrigo Cortés em “Enterrado Vivo”, ainda consegue prender a atenção do público, sempre utilizando-se de uma trilha sonora constante, mesmo que nada marcante ou original. É notória a sensação de estar preso naquele ambiente pequeno é gélido, sem qualquer proteção aparente. Comandando um elenco que demonstra sua inexperiência em tela, Brooks, porém, deixa cair o ritmo da narrativa em seu final, exatamente quando o roteiro de Chris Sparling delira, perde-se em suas pretensões, resultando em um filme cheio de absurdos que não merece ser visto pelos que apreciam um bom suspense.

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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, mas só mais tarde veio a entender a grandiosidade que é o cinema.

Darlano Didimo
@rapadura

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