Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de novembro de 2010

Minhas Mães e Meu Pai

Com a temporada de premiações chegando, o cinema independente norte-americano decepciona, desta vez com uma aparente comédia de costumes sem graça.

Os últimos dois meses do ano juntamente com os dois primeiros meses do ano seguinte costumam formar o período mais próspero de estreias no cinema. O motivo: a temporada de prêmios nos EUA está próxima. É a hora certa de os estúdios lançarem os melhores filmes e deixá-los ainda frescos na memória dos velhos integrantes que votam e distribuir estatuetas aos montes. E a última década tem demonstrado uma incrível força do mercado independente norte-americano nessas escolhas, levando a lona os blockbusters que tão bem representam Hollywood. Um exemplo claro está na vitória de “Guerra ao Terror”, derrotando o longa mais caro e de maior bilheteria de todos os tempos, “Avatar” na última edição do Oscar.

Um maior comprometimento com qualidade e originalidade são as principais propostas desse cinema, que transita entre dramas densos e leves comédias, mais comumente trazendo no roteiro o seu maior mérito, além de um elenco competente. Entre os mais novos exemplares independentes de olho nos disputados lugares de melhores do ano está este “Minhas Mães e Meu Pai”. Credenciado por contar com atores de peso nos papéis principais, o longa possui diversos acertos, mas se perde em meio a busca por um tom mais “irrelevante” do que o normal, devendo lutar apenas por escassos reconhecimentos na mais badalada noite do cinema mundial.

A trama não poderia ser mais alternativa: um casal de lésbicas é quem a protagoniza. Nic (Annette Bening) e Jules (Jualianne Moore) vivem juntas há cerca de vintes anos e dividem o lar com seus filhos adolescentes, Joni (Mia Wasikowska) e Laser (Josh Hutcherson), ambos concebidos artificialmente a partir do esperma do mesmo homem. Há poucos dias de sair do afago da família e enfrentar o mundo do ensino superior sozinha, Joni decide acatar ao desejo do irmão mais novo e sai secretamente em busca da identidade de seu pai biológico.

Poucos telefonemas são necessários até que a dupla consiga marcar um encontro com ele. O nome dele: Paul (Mark Ruffalo), um homem simples e relativamente bem sucedido que leva uma vida com poucos comprometimentos e obrigações. A afeição entre o trio é imediata, principalmente por parte da garota, que quer continuar em contato com o pai. O segredo é descoberto pelas mães e logo Paul adentra essa família, ocasionando uma série de novas, algumas agradáveis e outras nem tanto, situações para eles.

Dirigido e escrito por Lisa Cholodenko, “Minhas Mães e Meu Pai” sofre de um grave problema: não sabe em que gênero se enquadra. Talvez o mais acertado seja classificá-lo como uma comédia de costumes, retirando por completo a sátira que tão bem a classifica. O propósito parece ser explorar a desestabilização causada por Paul nessa família até então unida e isenta de preconceitos.   No entanto, o humor inserido pelo roteiro enfraquece por completo a seriedade das discussões propostas, prejudicando o posterior drama que se busca instalar.

Cholodenko se perde em meio aos diversos tons que flerta em sua história, trazendo personagens e situações que deixam a profundidade e reflexões de lado e parecem querer apenas fazer o público rir. Torna-se estranho, então, ver as mães desconfiando da sexualidade de Laser, deparar-se com um inexplicado caso extraconjugal, além de ouvir o que sai da “boca suja” de uma amiga de Joni. E depois de tudo isso ainda presenciar choros e arrependimentos no terceiro ato dessa trama.

O maior erro é o desenvolvimento inadequado da relação entre Nic e Jules. Tudo parece ir às mil maravilhas entre elas, até que beijos e sexo fora do casamento revelam um sério desentendimento que, aos olhos do público, não era nada evidente. Nic se cansa de falar que passa por momentos difíceis em sua vida, mas nunca diz o porquê. Seria uma crise de meia-idade? Problemas no trabalho? Entre diversas possibilidades deixadas negativamente em aberto pelo roteiro, a história deixa de convencer.

No entanto, é essa mesma Nic quem sustenta a trama. Diferente de outros personagens, ela parece real, uma mulher e mãe de verdade, que é dura com os filhos quando necessário, protegendo-os sem pestanejar, e amável com a esposa, chegando a preparar-lhe uma noite (inicialmente) surpreendente. A performance de Annette Bening traz ainda mais credibilidade para ela. Com trejeitos masculinos, mas sem exageros, a atriz se sobressai, já sendo considerada pela crítica internacional como um dos principais nomes para finalmente levar o Oscar de melhor atriz para casa.

Outro destaque no elenco vai para Mia Wasikowska. Se como a Alice de Tim Burton sua típica discrição não funcionou, aqui sua virtude é transformada em uma timidez conquistadora. Aliás, boa parte dos fatos que circundam seu personagem são os maiores méritos do roteiro, vide o desfecho do filme. E se Mark Ruffalo está confortável como um empresário do ramo alimentício dono de relacionamentos casuais, Julianne Moore representa bem os erros de “Minhas Mães e Meu Pai”. Como a hippie da família, a atriz é responsável pelas principais piadas e tiradas cômicas da história. E se até consegue fazer rir algumas vezes, fica longe de emocionar em todas as outras.

Guardando na intenção seu principal trunfo, o longa pode até proporcionar bons momentos de entretenimento, mas esse não costuma ser o objetivo das principais obras do cinema independente norte-americano. Sem ser provocativo ou mesmo original, o filme deixa a desejar. Apenas espera-se que ele não seja mais um caso de produção mediana reconhecida sem merecimento.

Darlano Didimo
@rapadura

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