Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de março de 2010

Lembranças

Este é mais um romance raso, mas pretensamene intenso, estrelado por Robert Pattinson.

De vez em quando, Hollywood lança um ator de rosto bonito, mas de nem tanto talento assim, que parece participar de uma estreia cinematográfica todo mês. Pois esse cara no momento é Robert Pattinson. Ele surgiu discretamente em “Harry Potter e o Cálice de Fogo”, já gerando alguns gritos alvoroçados de meninas na plateia. O caráter trágico do personagem, porém, impediu que o ator emplacasse na indústria. Um hiato de três anos, então, se seguiu até que Pattinson reapareceu como o mais romântico dos vampiros em “Crepúsculo”, tornando-se o ídolo e pretendente futuro marido de nove entre dez adolescentes do sexo feminino.

O sucesso foi tanto que até um filme inexpressivo que o ator havia feito anteriormente foi relançado, caso de “Uma Vida Sem Regras”. A sequência da franquia baseada nas obras de Stephenie Meyer foi o próximo passo na carreira do agora astro, que acabou perdendo espaço para outro ascendente ator, Taylor Lautner, que também já segue os rumos do colega de filme. Aproveitando-se da fama instantânea, Pattinson agora estrela mais um romance, o qual parece mais profundo e adulto que os anteriores. Mas “Lembranças” fica na intenção, pois é tão raso quanto outros filmes teen, com o acréscimo de querer pretensamente se tornar histórico.

Pattinson aqui interpreta Tyler Roth, um problemático garoto de 21 anos de idade que não consegue superar a morte do irmão mais velho nem lidar com as atitudes grosseiras do pai empresário (Pierce Brosnan). A única felicidade do jovem é a irmã mais nova, Caroline Hawkins (Ruby Jerins), uma precoce e talentosa artista. Com a incrível capacidade de se meter em confusões, Roth é preso pelo policial Neil Craig (Chris Cooper), cuja filha coincidemente estuda na mesma universidade do rapaz.

O nome dela é Ally (Emilie de Ravin) e ela também guarda um passado sofrido: presenciou, aos 11 anos de idade, o assassinato da mãe em um metrô de Nova Iorque. Ally se tornará alvo de uma aposta entre o recém-egresso da prisão e seu amigo Aidan (Tate Ellignton), com divide um pequeno apartamento. O envolvimento entre Tyler e Ally, então, acontece, mas o que era apenas interesse se transforma em uma tórrida paixão. Donos de vidas atribuladas, ambos encontrarão no outro a saída para os problemas diários que tem de enfrentar.

O que diferencia “Lembranças” de outros filmes do gênero é justamente o faz se tornar esquecível. Nele sobram conflitos familiares e dramas particulares de grande intensidade. A relação de Tyler com o pai passa longe de ser saudável, sobrando brigas e ameaças entre eles, já que o rapaz o acusa de ter causado, indiretamente, a morte do irmão e de ser ausente na criação da pequena Caroline. Enquanto isso, o policial Craig superprotege a filha Ally, impedindo-a de chegar tarde em casa e de questionar sua autoridade. O problema é que a profundidade dessas relações são mais rasas do que aparentam.

Com uma sempre presente trilha sonora, o diretor Allen Couter (“Hollywoodland”) procura instalar densidade nessa história, mas tudo parece desnecessariamente complexo. Tyler Roth está mais para um rebelde “quase” sem causa que procura se meter em confusão para chamar a atenção dos pais. A cena em que ele tenta desnecessariamente defender dois rapazes em uma briga de rua é ridícula, assim como a que ele insulta com um enfeite de escritório pensando ser um cinzeiro. Certo que seu pai pode não ser a melhor das pessoas, mas jogar toda a culpa de seus dilemas para cima dele é um pouco demais.

Escrito pelo estreante Will Fetters, o roteiro também deixa em aberto várias questões que poderiam justificar as atitudes do garoto, como a razão para a morte do irmão, que nunca é devidamente explicada. Também sobra para Ally, que parece ter uma relação legal com o pai em um primeiro instante, para depois, devido uma “escorregada” sua e uma consequente briga, sair de casa e ir morar com o namorado de um mês. Resumindo, Fetters procura e inventa fatos para transformar a paixão de Tyler e Ally em algo totalmente necessário para eles.

Como se não bastasse, o roteirista ainda se apropria de desenvolvimentos típicos de comédias românticas para construir sua trama: o garoto se aproxima da garota apenas para cumprir uma aposta; os dois acabam se apaixonando; ela descobre tudo e termina o relacionamento (e o final você já conhece). Para um filme que se pretende dramático, essa estrutura é bastante questionável. Para piorar completamente a situação, Fetters ainda guarda “uma carta na manga” no desfecho para transformar “Lembranças” em um  filme histórico. A surpresa é inevitável, mas completamente infeliz.

Se há algo que funciona no longa é a relação de Tyler com a pequena irmã e os problemas que a circundam. Estabelecendo-se quase como pai para a menina, ele traz a companhia masculina que nunca foi lhe dada apropriadamente. Sobram conselhos e carinhos entre eles, especialmente quando ela é humilhada pelas colegas de escola. Com especial talento para desenhar e comportamento diferenciado, Caroline é tratada como uma garota estranha, mas a proteção do irmão (exaltada em alguns momentos) a faz se sentir melhor.

Outro ponto forte do filme são as atuações, a não ser por uma em especial. Entre os coadjuvantes, temos o talento de Chris Cooper, que emociona na porém questionável cena inicial. Pierce Brosnan traz a bem dosada autoridade ao ausente pai, enquanto que a menina Ruby Jerins é uma revelação das mais agradáveis. Emilie de Ravin surge apaixonante dando a graciosidade exata a Ally. Já Robert Pattinson reaparece inexpressivo, sendo “engolido” toda vez que é forçado a contracenar com alguns dos atores mais experientes.

“Lembranças” é mais um filme de gosto duvidoso no currículo do astro do momento. Para as fãs, agora é contar os dias para que seu próximo filme chegue aos cinemas. Para todos os outros, é torcer para que esse período de estrelato dure pouco.

Darlano Didimo
@rapadura

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