Para a análise, entendimento e apreciação de um filme são necessários muito mais que olhos. É primordial considerar a identificação, a interação e a representação do imaginário de valores que cada um tem, que representa exatamente o motivo do sucesso de "Crepúsculo". Apesar de sofrer absurdamente por falta de equilíbrio de elementos, a saga mas reproduz precisamente os valores de uma geração.
É moda falar mal do que está na moda. Hoje em dia, “Crepúsculo” é o pior filme do mundo, é vergonhoso falar que se chora com “Titanic” e Stephenie Meyer não sabe escrever nem seu próprio nome. Além de, é claro, criar vampiros que brilham no sol, o que é um absurdo (!) – jogando fora todo o conceito de licença poética que se tem. Muitas vezes as pessoas nem lêem os livros nem assistem aos filmes, mas limitam-se a criticá-los unicamente porque o bom senso (comum) os obrigam.
A franquia literária e agora cinematográfica tem de cara um grande obstáculo: fazer um blockbuster romântico. E é justamente esse seu problema ou qualidade. O equilíbrio entre a carga romântica e a carga “hormonal” é uma tarefa árdua de se realizar. Blockbusters que tendiam para o drama e romance como “Superman Returns” e “Hulk” não caíram nas graças do público. Erroneamente, já que só a coragem de tornar secundário o que agrada ao público em um filme desses – ação, efeitos – é motivo de admiração. E talvez aí resida minha simpatia pelo primeiro filme da série.
“Crepúsculo” é, acima de tudo, um trabalho sincero. Tinha inúmeras deficiências, era um tanto mal feito, amador, mas foi concebido com carinho. Tinham efeitos especiais ruins e parte técnica carecendo de mais cuidado, mas é completamente evidente que sua intenção não era essa hora alguma. Seu propósito não era agradar a todos ou mostrar uma revisitação fiel ao mundo fantástico dos vampiros, mas sim retratar uma história de amor, com metáforas – rasas – e com pieguismo masoquista.
“Lua Nova” mostra-se melhor que o anterior, o que era claro desde o início das filmagens, e consegue aprimorar todos os aspectos do filme primogênito não só tecnicamente. Ainda que tenha mais cuidado, o filme sofre com frases de declarações inócuas, longa duração e menos “casualidade” como no outro longa. Mas é gritante que ele está muito mais encorpado como cinema e que pelo que se apresentou, a série tem constante tendência à evolução.
Na trama, acompanha-se a história de Bella Swan (Kristen Stewart), que sofre por conflitos mais maduros acerca de seu romance com Edward Cullen (Robert Pattinson), que acaba culminando no rompimento do relacionamento. Após Edward deixar Bella, ela cai em completa depressão e encontra a paz somente em seu velho amigo Jacob (Taylor Launter). Jacob acaba passando por mudanças de personalidade, o que confunde ainda mais Bella, que agora se tornou viciada em adrenalina, alegando ser a única maneira de encontrar-se com seu amado novamente.
É a partir desse contexto que Melissa Rosenberg assina o segundo roteiro da franquia. E é agradável ver o quanto ela se esforçou para entregar uma história mais amarrada e competente. Como toda adaptação, ela retira e acrescenta detalhes, tendo seus acertos, bem como seus erros, tomando mais cara de cinema. Ela conseguiu desvincular-se rapidamente do livro e concedeu identidade ao longa. Melissa peca por não conseguir organizar suas ideias de maneira que tornem-se consistentes – como Meyer fez no livro -, mas transcreve maturidade à película, como na frase final do filme, que mostra imensa disparidade entre os propósitos de ambos os filmes da franquia.
Evidenciando essa transição, foi escolhido o diretor Chris Weitz para comandar o filme. E qual a impressão? Weitz tem mais pinta de cineasta e traduz isso no filme, mas não tem a intimidade com a história como demonstrava Catherine Hardwicke. Por isso o ar de racionalismo, mesmo que estejam explícitas na tela as falas de teor romântico, sobrepõe o lado emocional do longa; além das representações de Edward e Jacob serem bem mais enjoativas que as filmadas por Catherine (como ele conseguiu?), com direito a superexposição desnecessária e irritante da imagem máscula dos protagonistas.
Weitz foi claramente escolhido devido a sua antiga experiência ao dirigir ursos, cachorros, lobos ou o que quer que sejam. Bacana é que Weitz não limita seu talento somente às cenas de ação. Ele opta por câmeras próximas aos rostos para demonstrar intimidade; não tão feliz quanto Hardwicke nas cenas mais íntimas entre Bella e Edward, por exemplo, mas o constante uso desses planos exala essa identificação por si só. Em outr ponto, sua filmagem dos Volturi foi bastante eficaz e a união entre bons atores e a competência do diretor fizeram dessa sequência tão boa quanto no livro, uma vez que o ápice da história foi transferido para cá.
O elenco, em toda sua abrangência, mostra-se mais competente. Kristen Stewart tem porte de protagonista e leva o filme nas costas. Uns podem considerá-la uma atriz inexpressiva, mas ela incorporou a personagem Bella e traduz para a tela algo bastante natural e com fluidez. Robert Pattinson – esse sim inexpressivo – é muito menos exigido aqui, mas não compromete nada. Taylor Launter teve seu papel com vertiginoso aumento de importância e esteve a altura para representar um personagem de extrema importância para que a história consiga sair do âmbito depressivo que ela se lança. Temos um bom elenco de apoio também, composto por Dakota Fanning – belíssima e imponente – e Michael Sheen, que certamente serão bem mais exigidos futuramente.
E adentrando para os aspectos técnicos, quesito massacrado no filme anterior, temos um avanço. Os lobos digitalizados são realistas, as batalhas são bem feitas, a maquiagem consegue com que os vampiros sejam mais fieis à descrição que Stephenie Meyer faz no livro, o movimento dos vampiros é mais crível. Tudo aqui está melhor. E se antes tínhamos uma edição de som ruim, com um subaproveitamento da trilha sonora, dessa vez o acerto na escolha das faixas, sendo elas mais maduras, mais descritivas e mais sutis, dão um tom especial às cenas. A trilha percorre Muse, Tom Yorke, Anya Marina, e é claro, o mestre Alexander Desplat, da trilha de “O Curioso Caso de Benjamin Button”, que traduzi em partituras os sentimentos do filme.
Mas depois de todas as observações feitas, todos os erros e os acertos, teorizo – e serei odiado por isso – que parte do “insucesso” de “Lua Nova” cabe aos fãs. Sei que é até desconfortável falar isso, mas a inquietação do público feminino conseguia romper qualquer linha narrativa mais profunda, e um filme que prezou por ser silencioso e denso, acaba sendo, em partes, ridicularizado pela reação do público. Weitz sabe o que agrada ao público do filme e insiste em reapresentá-los constantemente, o que torna a fórmula cansativa. Ele abusa de Pattinson em câmera lenta, de Taylor sem camisa e de coisas que podem até agradar às fãs mais devotas, mas certamente desagrada a uma outra grande parcela de espectadores.
“Lua Nova”, assim como “Crepúsculo”, merecem ser ao menos conferidos. Tratam-se de verdadeiros eventos que tomam todos os veículos midiáticos que lhes cabem e fazem com que pessoas, ainda que por fanatismo, acreditem na magia do cinema.